Jornal Minas aborda as diferentes faces do trabalho escravo em série de quatro reportagens

A escravidão no Brasil terminou, oficialmente, em 13 de maio 1888. Mas na realidade, esse ainda é um mal muito presente na nossa sociedade e que deve ser combatido por meio de ações que envolvem diferentes setores. Em 2022, Minas Gerais foi o estado com o maior número de pessoas em situação de trabalho escravo resgatadas e ocupa essa posição faz 10 anos. A série de quatro reportagens do Jornal Minas mostra as diferentes faces desse drama social.

Qual é o papel do Estado no combate a esse crime e como ele tem sido feito? Essas são algumas das perguntas respondidas no episódio de estreia da série que acompanhou o trabalho do Ministério do Trabalho e do Emprego. O primeiro alvo de fiscalização foi no Sul de Minas, em uma plantação de café em Conceição das Pedras. Na fazenda, migrantes trabalhavam e viviam em condições precárias e degradantes. No alojamento faltava água e condições básicas de limpeza. O proprietário foi notificado imediatamente sobre as irregularidades e providências que deveriam ser tomadas. Mas o trabalho do MPT não se encerrou aí, uma vez que é necessária a fiscalização do cumprimento do termo de ajustamento de conduta.

Todo empreendedor sabe quais são as suas obrigações. Mas, infelizmente, em relação ao trato com os trabalhadores, há muito descuido. Não tomam as providências, achando que não vai acontecer nada. E aí, um dia, acontece.

Marcelo Gonçalves Campos, auditor-fiscal do Trabalho

Entre os temas do segundo episódio está o relatório da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. O documento demonstra a seriedade do trabalho dos auditores do MPT baseado em critérios sólidos e comprometidos com a dignidade do trabalhador. As fazendas de café em MG concentram a maior parte dos registros de trabalho análogo ao de escravo. É em Três Pontas e Campo do Meio, também no Sul de Minas, que a equipe de jornalismo da Rede Minas acompanhou mais uma etapa da fiscalização.

No entanto, não é apenas no campo que é registrado o trabalho análogo do de escravo. Não é raro encontrar no ambiente doméstico pessoas que servem uma mesma família há gerações e sem terem os direitos trabalhistas básicos garantidos.

O escravo moderno não tem amarras, não tem correntes. A própria falta de salário, as ameaças, as coações já colocam [as pessoas] em situação de trabalho análogo ao de escravo.

Cynthia Saldanha, auditora-fiscal do Trabalho.

O terceiro episódio da série mostra a história de Ana*, mais um dos exemplos de “coisificação” de trabalhadoras domésticas que são repassadas de pais para filhos como uma herança. Além de ter seus direitos trabalhistas negados, ela sofreu violências e ameaças por quase cinco décadas. Na casa onde era escravizada, Ana dormia ao lado do galinheiro Paulo Veloso, Procurador do MPT, que esteve no resgate dela, reforça o papel do Estado no combate ao trabalho escravo. Na ação civil pública que está movendo contra os infratores, ele está pedindo quase R$ 7,5 milhões de indenização para a trabalhadora, a maior quantia da história.

“Ele me batia direto. Qualquer coisinha me batia. Era copada, era chute nas pernas. Um dia ele me deu um tapa no rosto. Ficou uma bolha preta assim. Ficou tudo preto. Os vizinhos perguntaram o que era aquilo. A mãe dele mandou eu mentir lá, dizer que eu tinha machucado.”

Ana, trabalhadora escravizada por 47 anos.

* Nome fictício

O próprio escravizado muitas vezes tem dificuldade em reconhecer a situação de exploração. No último episódio, é lembrado o caso de Madalena Gordiano, resgatada em 2020, e que sensibilizou todo o país. A herança escravocrata, racista, patriarcal e machista é apontada como uma das principais razões para que casos como o dela continuem acontecendo.

A normalização das relações abusivas de trabalho cria muitas vezes uma inércia até na pessoa que está sendo explorada. Por isso é necessária uma ampla fiscalização e uma atuação proativa do Estado. E a punição não pode ser apenas financeira, para evitar que valores financeiros simplesmente entrem em um cálculo de “custo” que pode interessar aos infratores. Uma das medidas é a “lista suja” do MPT, que prejudica as relações comerciais das empresas que não adotam boas práticas de combate ao trabalho escravo. Esses são alguns dos assuntos do quarto e último episódio da série.

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Para denunciar trabalho escravo acesse o site do Sistema Ipê.


Ficha técnica

  • Imagens: William Félix e Sandro Romero
  • Edição de imagens: Victor Caldas
  • Edição de texto: Cibele Penholate
  • Produção: Amanda Amaral e Renato Franco
  • Reportagem: Renato Franco

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